Integração Lavoura-Pecuária, 
como e quando adotar

Entrevista com os professores Aníbal de Moraes,
Amadeu Bona Filho (UFPR) e Claudete Lange (UEPG)

Nos últimos anos, a exploração de propriedades agrícolas integrando as atividades de lavouras e criações vem crescendo tanto no Paraná como no Brasil. Adotado com o objetivo de recuperar áreas degradadas, diminuir os custos de produção, preservar os recursos naturais renováveis e dar mais segurança ao empreendimento agropecuário, o Sistema Integração Lavoura Pecuária (ILP) pode ser considerado um avanço tecnológico similar ao que o plantio direto representa.

Como março é um mês importante para o calendário ILP, conversamos com os professores Aníbal de Moraes e Amadeu Bona Filho da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e também com a Professora Claudete R. Lang, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que há mais de dez anos desenvolvem trabalhos de pesquisa na área.

A Universidade Estadual de ponta Grossa possui uma disciplina no curso de graduação sobre Integração Lavoura Pecuária enquanto que a Universidade Federal tem um programa de pós-graduação voltado a formar mestres e doutores nesta área.

Procuramos questionar os especialistas em relação à temas importantes para esta época do ano, sobre as atividades que precisam ser feitas agora para o sucesso do empreendimento ILP. Como o assunto é extenso, procuramos nos ater apenas à implantação do sistema. Os aspectos de manejo de pastagem e de animais ficaram para a próxima entrevista.


Como podemos afirmar que um produtor usa de fato o Sistema ILP?
Profa. Claudete:
É preciso entender bem o conceito da ILP. Existem ainda muitos produtores que pensam estar fazendo o Sistema ILP. No entanto, eles estão com duas atividades distintas dentro da propriedade, que são a agricultura e a pecuária, cada uma por si. Para se ter uma ILP, é preciso uma visão sistêmica, trabalhando as duas atividades de forma integrada e complementar numa mesma área.

Quando o agricultor trabalha de fato a integração, ocorrem ganhos em termos de matéria orgânica do solo onde são incorporados resíduos das duas culturas (lavoura e pastagem), mais os excrementos dos animais proporcionando um aumento da Biodiversidade do solo e buscando um maior equilíbrio na fauna do solo, enfim há uma melhoria na sustentabilidade da propriedade do ponto de vista econômico, ecológico e social pois este sistema também representa uma das melhores alternativas para a viabilidade do pequeno produtor.

Quais são as providências imediatas para o produtor que pretende entrar na ILP?
Prof. Aníbal:
O primeiro passo para quem estiver ingressando é um bom planejamento, prevendo o dimensionamento de sua área, as divisões de piquetes, a localização das aguadas, os cochos de sal e a definição da categoria animal a ser usada no sistema.

Um ponto muito importante é o produtor não começar o ILP em toda sua área, de uma vez. O recomendável é iniciar com um pequeno módulo, para ir aprendendo, porque será uma novidade para ele. Dependendo do tamanho de sua propriedade, o ideal seria começar com uma área entre 10 e 20 hectares. Pequenas propriedades podem começar com menos. O que importa é a experiência a ser adquirida, principalmente no manejo da área, no manejo dos animais. Conheço a experiência de produtor que começou com 20 cabeças, e hoje está com mais de 1000 animais de engorda por ano, em que a experiência dos 20 primeiros foi fundamental. Do mesmo modo, existem experiências de produtores que iniciaram com 800 animais e, devido a falta de experiência, de conhecimento e gerenciamento necessários, acabaram fracassando já no primeiro ano.

Aqui no Paraná tem- se trabalhado com pastagens de inverno e de verão integradas a lavouras de verão (milho e soja) Como deve ser a divisão das áreas?
Prof. Aníbal:
Vencida a etapa de planejamento inicial, o produtor deve deixar de 20% a 30% de sua área total, para pastagem perene de verão. Os restantes 70% a 80 % (da área agricultável) devem ser deixadas para culturas de verão em rotação com pastagens de inverno. Estas diferenças no dimensionamento de áreas de pastagens de inverno sendo de 3 a 4 vezes maior do que as áreas de pastagens perenes de verão decorrem da necessidade de se ter uma oferta de forragem mais equilibrada durante o ano. O maior potencial de produção das pastagens de verão no período quente do ano acontece por Razões fisiológicas associadas às melhores condições climáticas em termos de temperaturas e precipitações.

Neste momento (março/ abril ) o que o produtor deve fazer?
Prof. Aníbal:
No final de março, as pastagens de verão estão na fase final de crescimento. O pastejo deverá continuar ainda em média por mais um mês a um mês e meio, dependendo da região. O mais importante é o produtor se programar para o que vem pela frente. Ou seja, até meados de abril (durante o outono) deve semear a aveia e o azevém para obter condições de pastejo já no início do inverno. O plantio no outono encontra melhores condições de umidade e temperatura para o desenvolvimento das espécies recomendadas. Após a colheita das lavouras, deve ser verificada a infestação de plantas invasoras, avaliada necessidade de se fazer a dessecação das mesmas e realizar a semeadura em plantio direto. Muitos produtores nesta ocasião utilizam a grade como implemento na implantação destas áreas, todavia esta prática é contrária aos princípios do plantio direto que deverá ser mantido mesmo para a implantação da pastagem de inverno. Nós indicamos o plantio direto porque reduz os problemas de compactação, pois se o solo for preparado com arado e grade, fica mais desagregado, sujeito a um maior impacto pelo pisoteio dos animais.

Quais as espécies mais recomendadas para o inverno?
Professor Aníbal:
São a aveia e o azevém, sempre em plantio direto. A aveia é mais precoce. Se ela for bem semeada e não faltar umidade, o primeiro pastejo pode ser feito entre 35 a 45 dias após a semeadura. Portanto, se a implantação ocorrer em 15 de abril, no final de maio ele já estará com os animais na área. Uma das vantagens do azevém é que, dependendo da quantidade de sementes que ficou de um ano para outro no solo, talvez a semeadura não seja necessária. Ao chegar o outono, as sementes do ano anterior começam a germinar e cobrem a área.

Qual a quantidade de sementes por hectare?
Professor Aníbal:
Desde que a semente seja de boa qualidade, são recomendados 30 quilos por hectare de azevém e 60 quilos por hectare de aveia preta. No caso de aveia branca, que está cada vez mais sendo utilizada a recomendação é de 80 a 100 quilos por hectare.

A adubação da pastagem é importante?
Professor Aníbal:
A questão adubação tem sido um problema na ILP, porque alguns produtores pensam que, adubando a lavoura haverá adubo residual e não será necessário adubar as pastagens. Isto não é verdadeiro. Normalmente, as lavouras são grandes extratoras de nutrientes e acabam deixando pouco de todo o adubo aplicado. Tem que adubar as pastagens com base na análise do solo. Sendo um solo bem equilibrado, pode-se fazer o oposto, adubar a pastagem de inverno e deixar que o resíduo desta adubação atenda as necessidades da lavoura (milho, soja, feijão) uma vez que a exportação de nutrientes pelos animais pode ser considerada como desprezível em se tratando de animais de terminação.

Professora Claudete: O objetivo da adubação é dar condições às pastagens de expressar seu potencial máximo de produtividade e, com isto, permitir uma lotação animal - a maior possível- e ainda a produção de biomassa residual suficiente para cobertura do solo, afim de evitar perdas da fertilidade do solo pela erosão e problemas de compactação.

Professor Aníbal: Outro aspecto importante que os produtores precisam saber é que, com adubação da pastagem, o volume de massa verde produzida é bem maior do que se não for adubada (2 a 3 vezes) . É por isto que, mesmo com o pastejo, há sobra de massa para a cobertura do solo quando do plantio da cultura de verão.

Podemos recomendar aveia e azevém para o norte e para o sul do Estado?
Professor Aníbal:
O Paraná tem, realmente, dois climas distintos. A região Norte, de clima mais quente, tem estiagens fortes durante o inverno que inviabilizam o azevém, a não ser que o produtor utilize irrigação. O limitante para o azevém no Norte não é a temperatura, e sim a falta de umidade suficiente para o seu desenvolvimento. No sul (abaixo do Paralelo 24), a mistura aveia e azevém é considerada a ideal para alimentação dos animais durante o inverno.

Qual a recomendação em termos de que tipo de animais para a Integração Lavoura – Pecuária?
Professor Bona:
Inicialmente há que se frisar que as pastagens utilizadas no sistema de ILP, são de elevado valor nutritivo, que permitem elevados ganhos de peso. Portanto, há que se escolher a categoria animal mais exigente, que é aquele que melhor responde neste tipo de ambiente com este tipo de alimento.

Se o produtor já tem os animais, o ideal é usar o sistema para a terminação. Usando animais com peso mínimo de 300 a 350 quilos, ou até 400 quilos, para fazer a terminação dentro de 90 a 120 dias. O uso de animais mais jovens também é possível utilizando bezerros desmamados que terá sua fase de recria na pastagem de inverno e sua terminação na pastagem de verão. Neste caso, é preciso contornar a questão cobertura de gordura, o chamado grau de acabamento, que está relacionado ao tamanho e à genética dos animais.

Como contornar a questão do grau de acabamento nestes casos?
Professor Bona:
Existem duas maneiras: a primeira, com suplementação energética o que implica em custos e demanda de estrutura mínima na propriedade. A segunda, usando a genética. Podem ser usadas raças de grande porte, como Simental, Limousin Charolês e seus cruzamentos, são raças cujo peso de abate para atingir o grau de terminação, que seria acima de 500 a 520 kg. Ou as raças européias como Angus, Red Pool, mesmo cruzados com zebuínas, que atingem o grau de acabamento com peso menor.


Rubens Niederheitmann
Coordenador do Programa Paranaense de Produção de Carne e Leite a Base de Pasto


Boletim Informativo nº 905, semana de 3 a 9 de abril de 2006
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná

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