Dívida rural:
medidas são paliativas 

Moacir Micheletto
Deputado Federal Moacir Micheletto

Nos últimos anos o governo federal e os meios de comunicação vêm exaltando o crescimento e os sucessivos recordes da produção brasileira de grãos. A safra recorde atual, estimada em 142,12 milhões de toneladas, representou incremento na produção de 28 milhões de toneladas nas últimas quatro safras. Realçam também que o agronegócio gera 37% dos empregos, é responsável por 36% das exportações e por 24% do Produto Interno Bruto (PIB). Tais notícias transmitem para a sociedade a impressão de que os agricultores e os setores a eles vinculados estão conseguindo excelentes resultados econômicos e financeiros com as suas colheitas.  

A realidade do campo não se mostra tão favorável assim: o produtor está cada vez mais endividado e as estatísticas oficiais mostram redução de área cultivada no país nas quatro últimas safras. Na safra 2004/05, por exemplo, foram plantados 49 milhões de hectares, enquanto hoje se cultivam 46,7 milhões. Mais de 2 milhões de hectares deixaram de ser semeados nos mostrando que o setor enfrenta dificuldades e procura compensar o aperto financeiro com o uso de tecnologias de ponta, mais produtivas, resultando em ganhos de produtividade.  

Ocorre, porém, que o resultado econômico dessa evolução tecnológica não permanece no campo, o produtor dela não tira proveito. Esses ganhos têm sido transferidos, ao longo dos anos, para os consumidores via queda de preços dos alimentos e estabilidade da inflação, o que repercutiu na menor rentabilidade e no endividamento do setor. A mídia tem divulgado os dados do Ministério da Fazenda, segundo os quais o setor agrícola tem, atualmente, uma dívida junto ao sistema financeiro nacional avaliada em R$ 87 bilhões, ou seja, supera o valor da produção de uma safra dos agricultores endividados. Esta dívida é bem maior se considerar, ainda, o débito com o setor privado e o capital de giro para financiar a safra em andamento. Estima-se que o débito total dos agricultores possa chegar a R$ 130 bilhões.  

O atual volume das dívidas rurais divulgado pelo Ministério da Fazenda (R$ 87 bilhões) é um retrato de momentos anteriores, 1995 a 2002, quando programas como Securitização, Pesa, Pesinha e outros foram criados com objetivo de solucionar os débitos dos produtores. Infelizmente, não alcançaram os resultados propostos, mesmo porque a rentabilidade do setor, que é baixa, mostra-se incompatível com o grau de endividamento agrícola. Tudo indica que foi aprovada agora uma renegociação com propostas semelhantes àquelas adotadas em programas anteriores. Esse conjunto de medidas não resolve de forma definitiva o problema que levou e leva o produtor ao endividamento, ou seja, a baixa rentabilidade da agricultura brasileira.  

Atualmente, em comparação com outros momentos que as dívidas rurais foram renegociadas, elas já são maiores, os juros são proporcionalmente mais elevados em relação à inflação e a rentabilidade da atividade agrícola não parece se alterar. Pode-se, pois, concluir que neste novo programa de renegociação, o governo federal apenas apresenta um paliativo para que os produtores endividados possam plantar por mais alguns poucos anos, sem qualquer possibilidade de resolver a sua situação financeira.  

Os produtores continuarão endividados e com dificuldades para ter acesso ao crédito junto aos agentes financeiros devido às limitações cadastrais. Com isso, cada vez mais passa ser agressiva a atuação das empresas fornecedoras de insumos no financiamento das lavouras. A dificuldade de acesso aos financiamentos oficiais obriga os produtores a recorrerem aos créditos privados, às firmas fornecedoras de insumos e a contratar vendas futuras das suas safras. Assim, os agricultores, de alguma forma, ficam dependentes dos que vendem insumos ou dos agentes que compram seus produtos, quase sempre distorcendo as leis de mercado.  

Para o plantio da próxima safra de grãos (2008/2009), a partir de agosto, um dado nos preocupa: o aumento abusivo nos preços dos fertilizantes, que mais do que dobrou em relação ao início do ano passado. Para muitas culturas, esta elevação de preços terá grande influência nos custos da produção. Certamente, será uma variável determinante na intenção de plantio. Não devemos nos surpreender se a área plantada se reduzir, este ano, por falta de capital de giro e as limitações do acesso ao crédito.  

O setor do agronegócio não pode assistir de forma passiva a essa situação de crise econômica e financeira, agravada ainda pela valorização da nossa moeda. É imprescindível que medidas efetivas e urgentes sejam tomadas na busca de renda do setor primário, condição essencial para que o produtor possa continuar na atividade.  

MOACIR MICHELETTO é

vice-presidente da Federação da Agricultura do Paraná e deputado federal

Texto publicado no jornal Folha de Londrina de 30 de maio de 2008

Boletim Informativo nº 1008, semana de 9 a 15 de junho de 2008
FAEP - Federação da Agricultura do Estado do Paraná
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